Texto por: Anselmo Tadeu Lopes
Minha primeira audição do Rush aconteceu em algum momento do segundo semestre de 1978, quando meu vizinho, João, comprou um simples aparelho de som e toda manhã rolava o primeiro disco da banda. Finding my Way, com aquele riff potente iniciava a música. Detalhe, minha mãe odiava a voz do Geddy Lee (risos).
Nunca poderia imaginar que o quinto disco de estúdio da banda, Farewell to Kings, iria definitivamente fazer com que eu olhasse para a banda de um modo mais especial, principalmente pela bateria de Neil Peart Xanadu, uma longa música de quase 11 minutos, me fez perceber como ele era diferenciado. Ainda não entendia o quanto ele já era importante para a banda como letrista.
Naquela época, tínhamos poucas chances de escutar rock and roll nas rádios. Na verdade, ficávamos informados por revistas nacionais e importadas sobre música, e como ainda não trabalhava, não as comprava (risos).
O ano de 1978 chega com o sexto disco, Hemisphires, um álbum grandioso! La Via Strangiatto não tem letra, mas a performance de Neil é soberba. Tínhamos apenas o disco, mas imaginávamos como ele estaria em sua bateria. Nossa imaginação nunca conseguia chegar aos pés do Neil, ele sempre nos surpreendia.
No disco Moving Pictures, a rádio Bandeirantes FM tocava direto Tom Sawyer, tanto que fui a uma loja de discos no centro de São Paulo e comprei o disco. Detalhe, nessa época eu era office-boy, e tinha uns trocados pra comprar discos. Preferia os discos ao invés de roupas, aliás, o que me motivou a trabalhar foi a chance de ter meu som e discos.
Me lembro que sempre entrava e saia da loja pra ver discos de rock e, logicamente, mais olhava do que comprava, mas minha determinação era tanta em comprar o disco, que mesmo conhecendo apenas e a faixa Tom Sawyer, peguei o álbum e fui direto ao caixa sem querer escutar. Ah! Era comum eu pegar um disco e pedir pra tocar algumas faixas.
Me lembro do rapaz da loja na rua São Bentol, no centro da cidade de São Paulo, me perguntar: “Você não quer escutar o disco? “. Falei: “É Rush, deve estar demais!”. Você não tem ideia da repercussão desse disco em 1981. Acredito que comprei em abril ou maio.
Tocou muito em casa, até meu pai gostava (risos). E a faixa The Camera Eye era a predileta. Naquele tempo, a banda foi o incentivo para que eu fizesse um curso de inglês, pois queria entender as letras e ir de contra o meu pai, que sempre tirava uma onda por gostar de uma música que eu não sabia o que estavam dizendo.
Definitivamente, a primeira grande influência na minha vida foi ser determinado em conquistar algo que desejo, o que soube mais tarde o quanto os três integrantes também eram. Mas sem dúvidas, Neil com suas letras era minha constante influência. O Rush sempre esteve ao meu lado com o passar dos anos e continua assim até hoje. Uma prova disso é meu consultório (sou dentista), que tem muito do Rush tanto no escritório, como na sala de espera.
Entrei na faculdade em 1984, em Araçatuba, no interior de São Paulo. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP, e adivinha? Não podia levar o aparelho de som, então achei um jeito de gravar algumas fitas com muitas músicas do Rush e, lógico, o entendimento das letras da banda. Sempre atemporal!
O grande desafio era entender o Neil, um cara fora da curva e inteligentíssimo! Em 1984, lançaram o Grace Under Pressure, uma virada no modo de produzir música. No início, não entendia nada. Minha limitação musical não conseguia ver na época o quão importante era esse disco. Outra importante influência que levo com o grande legado da banda é de nunca se acomodar e sempre se aprimorar. Fazer o melhor que você pode talvez não seja o suficiente, mas é o melhor que você pode!
Com o passar dos anos vamos amadurecendo e adquirindo novos conhecimentos. Com o Rush não foi diferente. Neil se mostra à altura das necessidades das musicalidades de Alex e Geddy. Verdadeiramente, eles fizeram um amálgama musical. Neil como leitor sempre expôs suas ideias e jamais as impunha.
Como fui de certo modo lapidado intelectualmente pelo Rush e suas letras, agora mais compreendidas do que outrora, meu “fascínio ” pela banda só aumentava. Discos, depois CDs, que nunca foram da qualidade dos vinis aparecem na cena musical assim como a MTV brasileira. O Rush chegou nas telinhas da MTV aos poucos, mas algumas músicas vistas já eram um bom motivo para visitar a loja e comprar, sem nem ao menos me dar o trabalho de escutar. Segui aquela retórica que ainda guardo comigo” é Rush, deve estar muito bom!”. Nunca me decepcionaram.
Quando voltei da Faculdade pra trabalhar em São Paulo, em 1988, as rádios já tocavam rock and roll. Tanto que o disco Hold your Fire, foi lançado por uma rádio e aguardei ansiosamente pra escutar em primeira mão. Maravilhoso! Com alguns clássicos da banda. Lá estava eu, tratando pacientes e escutando ao mesmo tempo o até então, mais recente trabalho, o Hold your Fire.
Neil já é a muito tempo um baterista e letrista consagrado pelos fãs. A mídia nunca foi generosa com a grandiosidade da banda, mas se você pergunta para o fã o que ele acha disso, apenas respondemos: “Crítico musical não faz história!” (risos).
Essa vontade de ter uma identidade única, fazer algo que eles gostem em primeiro lugar, sem se importar com o que outros pensam para se fazer sucesso, é a maior virtude de Neil. Sempre avesso a ser popular, centrado, possuidor de uma inteligência sem igual e poder de articular palavras como poucos, é o que me cativa cada dia mais. Sempre descubro algo novo mesmo após ter o escutado várias vezes. Esse é o poder dos grandes letristas.
Deixe uma resposta