Nunca mais vou fazer isso na vida!

Nunca mais vou fazer isso na vida!

Aqui na Belas Letras toda vez que alguém faz aniversário ganha esse dia de folga, desde que tope o desafio de fazer alguma coisa pela primeira vez na vida. O Gustavo resolveu fazer algo que, tecnicamente, não é a primeira vez, mas como você vai ler, é como se fosse…

“Há mais ou menos 15 anos, uns amigos da academia me convidaram para ir a uma pista de atletismo onde eles treinavam para participar de provas de corridas de rua. Quando cheguei lá, era um dia bem frio, fui recebido pelo instrutor, um sujeito alto e magro, cabelo bem curtinho. Ele disse o seguinte: “Quero que você dê quatro voltas na pista no teu ritmo, só para eu te avaliar”. Olhei para aquela pista de 400 metros: quatro voltas, moleza.

Saí correndo e, já na segunda volta, mal conseguia respirar; meu corpo doía todo e escorria saliva da minha boca como se eu fosse o alien do filme do Ridley Scott. Quando passei a terceira quase em pré-coma o instrutor teve piedade de mim e pediu para eu parar (“já deu pra avaliar”, ele disse). Na hora que eu parei, a primeira coisa que pensei foi: nunca mais na minha vida eu volto aqui.

Mas depois que retomei a respiração normal, tomei uma água e me sentei ali, com uma sensação meio estranha de dor e realização que não dá para explicar, me perguntei: quando é o próximo treino?

Foi desse jeito que começou minha história com corrida de rua, um esporte pelo qual me apaixonei. Aquele sujeito que me avaliou se tornou meu treinador, tive a oportunidade de correr os 5km, depois 10km, 21km, maratonas inteiras, em que conheci lugares e pessoas incríveis mundo afora. O publicitário Nizan Guanaes uma vez escreveu que a corrida é o novo MBA dos empreendedores e ela realmente me ensinou muitas coisas, principalmente porque meu treinador era uma espécie de Senhor Miyagi do atletismo, um corredor-filósofo, digamos assim. Algumas coisas que aprendi com ele:

  1. Lição sobre auto-confiança do senhor Miyagi: se alguém estiver na sua cola, nunca olhe para trás. Mostrar que você está com medo de ser ultrapassado dá mais confiança para quem quer ultrapassá-lo. Você deve sempre competir com você mesmo.
  2. Lição sobre planejamento do senhor Miyagi: ao contrário da maioria dos outros esportes, um lance de sorte (como uma bola que bate na trave e entra, no futebol, por exemplo) ou a ideia de que você vai se “superar” em apenas um dia especial em geral não existe. Você apenas vai conseguir executar aquilo para o qual se preparou antes.
  3. Lição motivacional do Senhor Myiagi: você vai sentir dor em algum momento. Quando isso acontecer, se for apenas dor muscular, deixa doer. Deixa doer e segue em frente. O corpo aprende a conviver com a dor se voce não tiver medo dela.

Esse terceiro ensinamento, na minha cabeça, não tinha aquelas vírgulas na época (se for apenas muscular…) e, há quatro anos, sofri uma lesão que me levou a outra lesão, e outra, e assim por diante, até que precisei parar, fazer algumas centenas de sessões de fisioterapia (cheguei a fazer duas POR DIA durante dois meses). Lembro que enquanto eu chegava a chorar em algumas sessões a fisioterapeuta tentava me motivar, acredite, dizendo exatamente isso: “Deixa doer!”.

Fui parando, reduzindo minhas corridas, até que há uns três anos, parei de vez. Troquei a corrida pela academia mais intensa, por isso engordei 15 quilos (mentira, não tem nada a ver com ganho de massa muscular…) e o Pilates. Até que chegou meu aniversário e me lembrei do Dia 1 aqui na Belas Letras. Que tal (re)começar?

Coloquei o mesmo tênis que calçava quando me lesionei e saí correndo por aí. Fiz oito quilômetros ao som dos Rolling Stones, num ritmo muito mais lento do que estava habituado. Quando cheguei, mandei a foto do meu relógio para o Senhor Myiagi, como sempre fazia para provar que tinha feito o dever de casa, ele me respondeu com o emoji de amém. Eu estava acabado, um fiapo de gente (não é uma alusão ao meu peso, obviamente). E disse pra mim mesmo: nunca mais vou fazer isso na vida!”

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